Programa vai urbanizar entorno da Lagoa da Francesa buscando solucionar problemas ambientais, urbanísticos e sociais

Fotos: Tiago Corrêa – UGPE

A história da cozinheira Vânia Oliveira, de 64 anos, é marcada por superações. Com uma experiência de 45 anos trabalhando com a venda de comida, em 2012 ela viveu o momento mais desafiador da sua vida e do seu negócio, quando foi obrigada a se mudar do bairro da Francesa, em Parintins (a 369 quilômetros de Manaus), por consequência de uma das maiores enchentes já registradas na região.

Recentemente, durante os primeiros estudos do Programa de Saneamento Integrado (Prosai) de Parintins, a casa dela chegou a ser cadastrada entre 1.077 imóveis situados na área de intervenção das obras, que precisariam ser removidos. Ela disse aos filhos que, se precisasse mudar novamente, abandonaria o negócio. A “aposentadoria” de Vânia, entretanto, vai ter que esperar mais um pouco. Graças a um estudo para redução dos impactos sociais do Prosai Parintins, uma nova alternativa surgiu e, assim como a Vânia, 323 moradores e comerciantes não precisarão mais sair do local onde vivem atualmente.

Desenvolvido pelo Governo do Amazonas, o Prosai Parintins vai urbanizar a área no entorno da Lagoa da Francesa, região com risco de alagação nos períodos de cheia. O projeto, anunciado pelo governador Wilson Lima, envolve obras de saneamento básico, como água, esgoto sanitário, habitação, drenagem, mobilidade urbana, construção de parques urbanos e outros equipamentos públicos, para resolver problemas ambientais, urbanísticos e sociais da região.

Diante de uma iniciativa tão transformadora para a Ilha Tupinambarana, uma preocupação da Unidade Gestora de Projetos Especiais (UGPE), órgão responsável pelo programa e integrante da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Urbano e Metropolitano (Sedurb), é que as obras causem o menor impacto possível à rotina dos moradores.

“Evitar reassentamentos que não sejam absolutamente necessários é uma premissa do programa e uma recomendação do governador Wilson Lima, preocupado com o bem-estar das famílias”, afirma o secretário estadual de Desenvolvimento Urbano e Metropolitano, engenheiro civil Marcellus Campêlo. Esta medida reduz custos com desapropriações e permite que as intervenções sejam concentradas nas famílias em situação de maior vulnerabilidade social e que estejam em áreas de risco, precisando realmente serem removidas para moradias seguras. Ele explicou que os primeiros estudos foram mais técnicos, levando em consideração a mancha de inundação, com dados das cheias dos últimos 50 anos.

“Numa segunda fase, quando fomos in loco, fizemos um estudo mais apurado e percebemos que havia muitos comércios consolidados, e que o impacto social e econômico seria muito alto. Detectamos que, com algumas intervenções específicas, seria possível fazer as adequações necessárias, de forma a garantir segurança e, ainda, valorizar estes imóveis”, destacou o secretário, ao explicar que essa nova abordagem busca conciliar o desenvolvimento urbano com a preservação ambiental, levando em consideração as necessidades das pessoas que vivem e têm trabalhos consolidados nessas áreas.

Para a proprietária do Restaurante da Vânia, a notícia de que poderá permanecer em sua localização atual, traz alívio e uma perspectiva ainda melhor para o seu negócio. Recém-reformado, o restaurante, hoje, gera cerca de 20 empregos diretos, em um ambiente com capacidade para receber 400 clientes simultaneamente.

Ela relembra com tristeza o momento em que precisou deixar seu estabelecimento, durante a enchente de 2012. Mas, agora, vê a possibilidade de um futuro mais estável para seu negócio. “Com a chegada do Prosai, eu tenho certeza de que nossa cidade vai se desenvolver e vamos poder gerar mais empregos”, comenta, emocionada.

O projeto completo do Prosai Parintins inclui uma área de intervenção de 119 mil metros quadrados, alcançando os bairros da Francesa, Palmares, Santa Clara, Rita de Cássia e Centro, impactados diretamente pelas obras. A principal área de abrangência será a Lagoa da Francesa.

Comércio valorizado

De acordo com o subcoordenador de Planejamento da UGPE, Leonardo Barbosa, outro motivo para os comerciantes comemorarem é que os projetos incluem obras na Feira do Bagaça, com a construção do novo mercado na Orla da Francesa. Serão 80 boxes, com interligação viária e toda estrutura para abrigar os vendedores ambulantes.

A ideia é expandir as atividades no local e, além de restaurantes e lanchonetes, abrir as portas para o artesanato e atividades artísticas. “Essa é outra vocação natural de Parintins. Com isso, além do público local, a região deverá atrair turistas, o que vai ajudar o município a se desenvolver, com mais emprego e renda”, observou.

Programa

Ao todo, as ações de reassentamento do programa vão transformar a vida de 5.385 moradores de áreas de risco no município, que sofrem com alagações, falta de saneamento básico e riscos de desabamentos. Com a readequação recente realizada no programa, houve uma redução no número de famílias a serem retiradas das áreas de alagamento, passando de 1.077 para 832. Entre as soluções de moradia está a construção de dois parques residenciais, com 504 unidades habitacionais.

A subcoordenadora Social da UGPE, Viviane Dutra, explicou que entre as diretrizes do Plano de Reassentamento estão a oferta de diferentes soluções. Além disso, liberdade de escolha para as famílias a serem reassentadas, sempre garantindo que a nova moradia tenha padrão melhor, sem repasse de custos às famílias impactadas.

O plano prevê, ainda, pagamento de indenizações justas, para evitar o empobrecimento da população afetada. “Todos os prejuízos permanentes ou temporários ocasionados pela implantação do programa serão reparados, mitigados ou compensados”, destacou. As ações de reassentamento devem demandar um investimento de R$ 112 milhões.

Os parques residenciais devem beneficiar moradores de imóveis avaliados abaixo de R$ 70 mil. Caso contrário, os moradores serão devidamente indenizados, em cálculo feito com base em metodologias da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). As soluções preveem, ainda, imóveis de uso comercial, que contarão com a reposição de 173 unidades ou indenização. O plano contempla Bolsa Moradia, projeto que oferece uma solução transitória para as famílias em habitações temporárias, enquanto a resolução definitiva não for disponibilizada.

Viviane frisou que, para garantir que as decisões tomadas no programa reflitam as necessidades da população local, o Prosai conta com um Grupo de Apoio Local (GAL), que funciona como um elo entre a comunidade da região e os agentes públicos. “No Prosai, temos 12 grupos por frentes de cadastro, com 123 representantes escolhidos, dos quais 55% são mulheres”, explicou a subcoordenadora, destacando que o programa assumiu o compromisso de promover a diversidade de gênero e a atenção especial aos grupos vulneráveis.

Obras

Após as consultas públicas realizadas no município para apresentação do projeto, o início das obras do Prosai Parintins está cada vez mais próximo. A expectativa é que, ainda no segundo semestre deste ano, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), financiador do programa, formalize o contrato para a liberação dos recursos. Os investimentos previstos são de U$ 87,5 milhões (o equivalente a mais de R$ 400 milhões), sendo U$ 17,5 milhões de contrapartida estadual.

O secretário Marcellus Campêlo informa que, assim que houver a aprovação do financiamento, as primeiras licitações já poderão ser realizadas, para adiantar a contratação e as obras. “Nossa intenção é que as obras iniciem no primeiro semestre de 2024”, adiantou.

Ele pontuou que, no próximo mês, deve ser apresentado um relatório com o resultado das consultas públicas realizadas no município, com as sugestões indicadas pela população. “O que for possível absorver, vamos incorporar ao projeto. O que não for possível, vamos justificar o motivo. Nenhum morador ficará sem respostas. Tenho certeza de que o programa e as obras executadas serão motivos de orgulho para a população de Parintins”, avaliou.